É interessante pensar na proporção que uma obra de arte pode tomar. Ele, sozinho em sua oficina de trabalho, traço por traço, pincela com a alma, dá vida ao inanimado, tijolo por tijolo até que seu castelo esteja completamente erigido.
Auto-retrato do artista.
No cotidiano de sua lida, o pintor não pensa: "Uhm, vou pintar esse quadro e ele vai valer 50 milhões de dólares". Então... como é este processo que atribui o valor artístico de uma obra? Como um traço vale tanto?
Hoje li esta notícia e me surpreendi. Vocês estão olhando para uma tela que vale 35 milhões de dólares. A obra de maior valor pertencente a um artista vivo. Será que nesse caso poderíamos dizer que vale o quanto pesa? (ok, piadinha politicamente incorreta)
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Alguns de seus trabalhos:
Não conheço nada sobre a biografia do cara, apenas admiro sua obra. Por isso não enrolarei meus 4 leitores nem inventarei coisas que não sei. Apenas disponibilizarei alguns links sobre ele, caso vocês se interessem em consultar. O fato é que não há como ficar apático frente ao traço de Lucian Freud.
Aqui no passado os nossos homens célebres costumam ser homenageados com medalhas, capas de revistas de fofoca, estampam as fotografias de jornais, são "vítimas" de coberturas audiovisuais a respeito de suas vidas profissionais e privadas, são donos de páginas e páginas de nossos periódicos; até estátuas nossos homens de destaque ganham. Tudo para as nossas inestimadas celebridades.
Mas eu custo a entender, prezado escafandrista, como alguém pode considerar que excrementos de aves urbanas possam ser concebidos como homenagem. Sim, prezado escafandrista, a maioria das homenagens citadas terminam como banheiro público dessas aves e outros animais afins. Não sei se o prezado escafandrista entende o conceito de banheiro, por isso tentarei explicitá-lo para seu maior entendimento.
Em nossos dias aqui no passado, utilizamos locais reservados para realizar nossas necessidades fisiológicas, como fezes, urina, e, algumas vezes, para satisfazer nossas vontades sexuais. Aqui no nosso pretérito-mais-que-imperfeito, consideramos todos estes atos como sendo imorais.
Agora observe, prezado escafandrista, seus descendentes consideram imoral o que é da natureza.
Meu caro homem do futuro, ajude-me a entender o seguinte: como algo inerente ao homem pode considerado imoral? A moral, então, é algo não-transcendental? A moral está além do homem?
Vocês aí no futuro, cagam e mijam? Vocês ainda têm o hábito de foder?
"Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma e sim um signo do zodíaco."
Gabriel Garcia Márquez - Memórias de minhas putas tristes
Nós aqui do passado temos o hábito de freqüentar praias, namorar olhando as estrelas, bater papo tomando uma cervejinha, entre outras atividades realizadas a céu aberto. Responda, caro escafandrista, existe cerveja aí no futuro? Qual o entorpecente que vocês costumam utilizar? Meus contemporâneos usam vários tipos de drogas (sim chamamos os entorpecentes de drogas, como se fosse uma droga se entorpecer, imagina...), a maioria delas já foram institucionalizadas, enquanto outras permanecem ilegais (por falar em ilegal, vocês têm leis por aí?).
Qual é a pena para os que não seguem as leis? Aqui no passado as penas são aplicáveis quase que exclusivamente para os que não possuem dinheiro. Estimado escafandrista, vocês aí do futuro possuem dinheiro? Como é a distribuição da riqueza entre vocês? Aqui no passado é tudo muito desigual. Uma pequena parcela da população conventra a grande maioria das riquezas do mundo.
Há gente morrendo de fome no futuro, prezado escafandrista? Aqui no passado isto é coisa rotineira. Morrer de fome faz parte do cotidiano de muitas famílias. Não que eu me importe com isso, pois tenho a minha fatia do bolo (ainda que pequena, quase ínfima fatia).Nós temos fome de consumo.
Sinopse: O diretor Mike Figgis (Despedida em Las Vegas) inova ao dividir a tela em quatro partes para contar a história de um misterioso assassinato. Quatro personagens principais estão no centro da história: um executivo do cinema e sua esposa, uma aspirante a atriz que está no meio de um caso e uma mulher cujas ações irão alterar para sempre seus destinos.
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Mais uma sessão do Cineminha na Liga aqui no Blog. Dessa vez o personagem principal é um diretor (e roteirista) inglês, chamado Mike Figgis. Figgis é um entusiasta do cinema digital e seus filmes tentam quebrar barreiras e preconceitos que muitos cinegrafistas ainda têm em relação ao video no cinema.
Ele mostra que é possível fazer filmes de qualidade com baixo orçamento, sem precisar recorrer à película e se submeter a todas as suas limitações. Dá um empurrãozinho em todos aqueles que possuem idéias na cabeça, uma mini-dv à mão, mas não têm coragem pra começar a filmar.
Minha opinião
Um experimento audiovisual. Uma tela dividida em quatro e um filme feito sem cortes, em tempo real. Hitchcock fez algo parecido no brilhante Festim Diabólico, filme realizado com apenas um corte (quem não se lembra do zoom in e out nas costas de um dos personagens?), mas não com a extensão e ousadia do Mike Figgis. O roteiro deixa a desejar, é verdade, mas a sincronia entre as "cenas" compensa. Ensaios e improviso. Tudo na medida certa.
Alex é o galã às avessas. Executivo do cinema, atravessa a meia-idade utilizando sua posição social para arrumar sexo com aspirantes a atriz. Cheira o tempo todo (aliás, qual personagem ali não é adepto ao pó?), trepa num cantinho com uma de suas amantes, enquanto sua mulher sofre de crise existencial na sala ao lado. Diz querer largar tudo e ir viver em Toscana. Propõe isso à sua mulher e à amante (Salma Hayek interpretando a maior biscate de sua carreira), porém fica claro que ele não abdicaria de suas facilidades para ter uma vida mansa em uma região remota da Itália. É tudo tipo.
Em uma das cenas (ou seria em quatro das cenas?), os operadores de câmera executaram um close up nos atores em quadro, talvez como uma tentativa de aproximação psicológica daqueles personagens. Interessante observar que todas as câmeras portavam lentes grande-angular (o que costuma tornar os closes mais poderosos, devido às distorções que essas lentes provocam ao se aproximarem do objeto em foco).
Em termos de história não há muito o que falar, mas a narrativa se torna interessante pela escolha estética do diretor. Pode se tornar confuso em alguns momentos, mesmo com a edição de som ajudando a identificar os "diálogos-chave" para ninguém se perder no meio do caminho. É, sem dúvida, um filme para iniciados e não para iniciantes (não havendo nenhum tipo de julgamento de valor neste enunciado).
* Destaque para a Holly Hunter (mesmo num papel sem destaque), sempre maravilhosa.
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Trecho do filme:
** Leitura indicada: Digital Filmmaking - Mike Figgis / Faber and Faber, Inc. 2007
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Promoção da semana:
Seja o primeiro a ir até meu scrapbook e dizer: "Salma Hayek é gostosa pra chuchu" e ganhe um brinde sensacional!
Sim, um dia fomos minhocas. Vivemos décadas sob a terra nos amontoando. Possuíamos um ritmo frenético pois fomos informados por uma força do além que precisávamos produzir (e nós, talvez ingenuamente, acreditamos). Diariamente milhões de nós transitávamos por debaixo de calor, concreto, barulho e pernas, como que, pisoteados, fôssemos levados do trabalho para casa e de casa ao trabalho. Trabalhamos muito, sem saber exatamente o motivo de tanto labor (e dissabor). Vivemos o dia-a-dia desconhecendo o porquê. Lutamos pela nossa existência na desistência de saber pelo que existir. Ignoramos o instinto, somos apenas carne e razão. Formigas ambulantes, perdidas abaixo do solo, cuja única missão é erigir uma civilização. Progredir... progredir... num ir-e-vir cuja meta é lugar nenhum.
Religiões nos dão respostas superficiais e fantasiosas, são mitos de muitos. Há também os filósofos, que se esmeram em explicar o que parece inexplicável. Será que o prezado escafandrista, homem do nosso futuro, já foi presenteado com o que nos parece ser a grande resposta da vida: o motivo do processo nascer-e-morrer?
Prezado escafandrista, caso a viagem no tempo já seja possível na sua Era (meus contemporâneos acreditam que um dia será), peço que venha nos visitar aqui no passado e nos conte algumas de suas velhas novidades. Somos ávidos pelo conhecimento, ainda que não saibamos o que fazer com ele. Vivemos no escuro, pisoteando civilizações passadas como quem dança o ritmo compassado e moroso do que chamamos de concreto. São dois pra lá, e dois pra cá. E fica a pergunta...
... prezado escafandrista, do que é feito o futuro?
A tecnologia aliada à História. Imagens produzidas no outro lado do mundo chegam aos nossos olhos em questão de segundos. Em contrapartida, muitas imagens dividem o lugar conosco sem que nosso olhar se volte a elas.
Os escafandristas descobrirão, através das imagens do cotidiano, como foi nossa civilização com uma dimensão extraordinariamente maior do que nossos arqueólogos o fazem hoje. Hábitos, costumes, normas, condutas, afeições, tudo poderá ser detalhadamente identificado através dos registros de imagem das nossas, hoje frenéticas, câmeras digitais. Nossa ferramenta não será mais o osso, mas a câmara escura. Nossa invenção não será a roda, mas a construção da iconografia do cotidiano.
Este espaço também destina-se à publicação de cenas públicas e privadas. O registro do nosso dia-a-dia e o de nossos contemporâneos. Vamos nos comunicar com a tribo futura, contando aos nossos descendentes remotos como vivíamos em nossa prosaica civilização. O cotidiano será o personagem principal em nossas cartas.
Caso o leitor queira compartilhar imagens de sua autoria, estão convidados a alimentarem este pedaço de bits e bytes. Basta enviar um correio com a imagem, legenda, e data da situação ocorrida.