quinta-feira, 3 de abril de 2008

Literatura: poesia&música (ou não)

Gata não mia
Mas pede em segredo
A felicidade
Busca nos sonhos
A realidade
Não dorme pra ter raiz
Gata não reza
Mas pede em segredo
Um dia feliz
Busca na vida
O que se quis
E ainda assim
Marca pontos por fora
Gata não ama
Mas pede em segredo
Na minha cama
Busca no amor
Mais do que fama
Quer sentir dor
Gata que inflama

©

terça-feira, 1 de abril de 2008

Cineminha na Liga: A Rainha Margot

Ficha Técnica

Título no Brasil: A Rainha Margot
Título Original: La Reine Margot
Direção: Patrice Chéreau
País de Origem: França
Gênero: Drama
Ano de Lançamento: 1994
Elenco: Isabelle Adjani,Daniel Auteuil, Jean-Hugues Anglade, Vincent Perez, Virna Lisi, Pascal Greggory, Miguel Bosé






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Baseado no livro homônimo de Alexander Dumas, A Rainha Margot é, além de uma aulinha de História, uma abordagem psicanalítica sobre as questões levantadas, posteriormente, por Freud a respeito da necessidade da morte simbólica dos pais para a possibilidade de formação / construção do indivíduo.

Trata-se, sobretudo, de um tema contemporâneo: ódio religioso com fundo político (qualquer semelhança com o que ocorre hoje entre Cristãos x Muçulmanos x Judeus é mera coincidência?). Guerra civil entre católicos e protestantes, onde esses últimos eram obrigados a abjurarem de suas crenças se quisessem sobreviver.

Uma das coisas interessantes no filme, é como a psicologia dos personagens é delineada através de seus atos e gozos sexuais (quase sempre) desregrados. Na história contada por Dumas, e ilustrada por Chéreau, o desejo e o ato sexual são colocados como imperativos de gozo. Freud e Lacan se redescobririam mais tarde, em suas respectivas teorias psicanalíticas.


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Liberdade para o sexo em oposição à privação do amor.

É curioso observar como o sexo é encarado de forma natural e aceitável, enquanto o amor é, de certa forma, considerado algo maldito. O amor é visto como uma fraqueza. Inversão dos valores contemporâneos. Hoje valoriza-se muito mais o amor e condena-se o sexo. Isso pode soar como um paradoxo, num mundo onde bundas são estampadas em capas de revistas e o sexo é vendido às claras nas esquinas das grandes cidades, porém, não é necessário se aprofundar muito na questão para observarmos o quanto a sociedade atual julga o comportamento sexual de seus contemporâneos. Tentamos ser "modernos" (os contemporâneos de Margot o eram), porém retrocedemos vertiginosamente no que concerne às questões sexuais. A pós-modernidade é retrógrada e se esconde sob um disfarce progressista.

Fugi um pouco do filme para filosofar a respeito do contra-senso que permeia os valores morais do século XXI. Vou voltar à obra para tentar colocar sentido a estas minhas palavras desconexas.


Em determinado momento do filme, Margot diz ao seu marido que mostrar amor a alguém deve ser evitado, pois enfraquece o indivíduo, oferecendo armas para que o "inimigo" o destrua. Dumas coloca o amor como sinônimo de morte? É interessante lembrar que, em francês (idioma original da obra), usa-se o termo petit mort (pequena morte) para se referir ao clímax sensual – também conhecido como orgasmo.

O comportamento sexual de Margot é predominantemente masculino, pois suas atitudes indicam que ela é a predadora. É ela quem vai à caça de suas vítimas, tendo como meta exclusiva o gozo. A jovem é conhecida no Reino por suas práticas sexuais, e seu comportamento frio (indiferente) no que diz respeito aos sentimentos. Porém, em determinado momento, ela se percebe apaixonada... e por um protestante. Até conhecer La Môle, Margot parece sofrer uma interdição ao amor. Ao se apaixonar, ela "abdica" dos valores familiares e, conseqüentemente, da hipocrisia que imperava em sua família, para passar para o outro lado. Alia-se ao seu amor e, com isso, torna-se também aliada dos protestantes. Margot vislumbrou que só poderia se transformar em sujeito que ama caso se afastasse da sufocante família à qual fazia parte.

Outro ponto que também pode ser analisado pelo viés psicanalítico, é a notável dependência que o Rei Carlos IX possuía em relação à sua mãe, assim como a qualquer outra figura impositiva / absoluta. O pai de Carlos IX morre cedo, deixando o trono para seu primogênito assumir ainda criança. No decorrer do filme, torna-se evidente o efeito que a ausência da figura paterna causa na vida do rei – ainda que a Rainha Catharina (mãe de Carlos) tenha substituído a figura do pai. Esta substituição da figura materna pela paterna acaba por gerar, também, a ausência do feminino no seio familiar (o que talvez sirva como influência para o comportamento de Margot, já que sua mãe a masculiniza durante toda a história). O Almirante Coligny (protestante e melhor amigo de Carlos IX), serve como apoio paternal ao Rei. Após a morte deste, Carlos IX realiza a transferência da figura da paternidade para seu cunhado, Henrique de Navarra. Em um momento da narrativa, o rei diz que Coligny serviu para que ele se tornasse independente da mãe e, de certa forma, se tornasse independente dele próprio.


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Dúvida: há amor incestuoso entre a Catharina e seu filho Anjou? Muitas vezes há indicações que respondem a esta pergunta, mas nenhuma resposta é definitiva. Eu acredito que haja sim, até por todo o tal contexto psicanalítico que mencionei anteriormente. A rainha gostaria de governar ao lado de um rei que a merecesse. A rainha e o rei juntos, sentados no trono, em seus delírios de mandos e desmandos. Cortem cabeças, apunhalem os inimigos, embrenhem-se nas entranhas daqueles que se opõe.

Ali está a semente que germinará, fazendo nascer, anos mais tarde, o Estado Absolutista francês.

Matar em nome de Deus. Um deus. Qualquer deus. Há deus? Adeus.


Vive la Révolution!


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Em relação à parte técnica, destaque para a fotografia primorosa, figurino, direção consciente, direção de arte (certamente com intenso trabalho de pesquisa)... tudo nota dez. Além disso, há a performance impecável da Isabelle Adjani, alva, linda, e perfeita em cada gesto.


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* Indicação de Filme: Lutero - Eric Till
* Indicação de Leitura: A Rainha Margot - Alexander Dumas
Hamlet - William Shakespeare









Trecho do filme:

Cineminha+IV



** Mais uma vez me desculpo pela evidente falta de linearidade do texto.

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PROMOÇÃO MALUCA:
O primeiro leitor que escrever a seguinte senha no meu scrapbook ganha um magnífico prêmio:
Agatha, ò, Soberana, cadê meu prêmio?


domingo, 30 de março de 2008

Literatura: Técnicas de Sedução

Era sempre a mesma história. Ela fugindo das investidas dele, e ele, cada vez mais incisivo, tentando levá-la para a cama de qualquer jeito.

Dionísio e Isadora haviam se conhecido há alguns meses na casa de um amigo em comum, que já o havia alertado sobre a atitude pudica da amiga em questão, fato que fez com que ele fosse invadido por um desejo incontrolável de desvirtuá-la. A idéia de ser o primeiro a se deitar com ela, a idéia de corrompê-la, a idéia de apresentá-la aos prazeres mundanos o seduzia imensamente.


Ela viveu seus 23 anos em abstinência total dos prazeres sensuais. Era uma virgem que dizia querer preservar sua castidade até que encontrasse seu príncipe consorte. Dona de um temperamento passivo e às vezes apático, vivia de forma indulgente, guardando a felicidade para ser vivida apenas no dia seguinte. Sem saber, na sua inocência de menina pós-púbere, que o dia seguinte poderia não chegar.
As investidas de Dionísio eram cada vez mais agressivas. O que começou com flores, bombons e convites para jantar, se transformou em telefonemas libidinosos no meio da noite, mensagens eróticas, sempre diretas e sem rodeios.
Durante bastante tempo Isadora se manteve implacável aos apelos de seu pretendente, não cedendo sequer um beijo ao pobre Dionísio, que, a esta altura, já dedicava todos os seus momentos de solidão lasciva à imagem de sua musa inspiradora. Não era possível dormir e acordar sem pensar nela, sem imaginar seu toque, sua boca, seus carinhos, e seu sexo tímido engolindo o dele. Era assim que começava a se masturbar, e terminava sempre jorrando seu líquido seminal em abundância. Cada gota de seu leite era destinada a ela.


Não é que Isadora não gostasse de seu admirador. Ela gostava. Gostava das conversas, gostava da companhia e também gostava de se sentir desejada. Chegou a se sentir excitada uma ou duas vezes, mas se penitenciou por ter tido tais reações físicas. Não queria pensar nisso. Não queria pensar que poderia renunciar à sua virtude precocemente, e, o que seria pior, com a pessoa errada. O que ela precisava era de uma prova cabal de que Dionísio seria o homem que a faria ceder aos prazeres da carne, que a faria sucumbir em seus braços, que a faria entregar seu corpo e sua alma de moça pura. Ainda que ela precisasse dessa demonstração, ela não sabia ao certo como essas provas se apresentariam.

Em uma noite escura de outono, quando levava Isadora para casa após assistirem a uma retrospectiva de cinema político italiano, Dionísio se apercebeu em um momento inefável de cólera. Mirou para sua companhante, aproximou-se dela ostentando um olhar inflamado, pegou em seus braços com força e a levou até o muro mais próximo, enfiando a língua quente e viril dentro de sua boca. Viu-se como um vampiro ao sugar e morder o pescoço de Isadora enquanto esmagava o corpo frágil de sua vítima usando como compressores a parede e seu próprio corpo. E, como um animal faminto que devora sua presa, rasgou as roupas delicadas de mulher inocente e enfiou seu membro rijo dentro do sexo até então imaculado de Isadora. Nesse momento ela já se contorcia, entregue aos delírios que eram apenas daquele homem, mas que agora tratava-se também de seus próprios desejos. E eram.

Tudo aconteceu ali, em uma rua deserta e mal iluminada, a duas quadras de sua casa. Foi então que ela compreendeu. Estava ali a prova que precisava. Era ele o homem com quem tencionava passar o resto da vida.

Em três meses estavam casados e ela, radiante, carregava em seu ventre o primogênito do casal. O primeiro dos quatro filhos que tiveram.

Amanhã será a colação de grau de Ricardo, o filho mais novo do casal.

© Agatha


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* Filme recomendado: Ata-me, Pedro Almodóvar
* Leitura recomendada: Memória de minhas putas tristes, Gabriel Gárcia Márquez