Todos
eles apareceram na festa que dei na minha mente ontem à noite, mas
nenhum deles quis beber comigo. Sentaram-se numa mesa, olhavam pra mim
com a discreta desaprovação que vão ao casamento da noiva grávida.
Nenhum deles ainda tinha rido, nenhum deles ainda tinha chorado, apenas
ficaram com aquela mira intermitente para mim, que estava sentada,
horrorizada, no lugar de honra da festa.
O mais chorado
manifestou-se. Veio até mim, me dizendo que nunca esqueceu, nunca vai
entender o porquê, mas nunca me cobrará as explicações. Só queria que eu
soubesse. Só queria que eu soubesse...
Eles sempre querem que saiba!
O de amor olhou pra mim de soslaio, permitiu-se mais um gole de Whisky,
foi-se embora da festa e pra tanto, passou por mim imperioso. Nem
sequer teve a misericórdia de me olhar nos olhos. Aqueles olhos tristes
me doeram tanto! Acabou retornando, porque ele sabe que se sair da minha
memória, morre.
As bocas que não beijei se riam despudoradamente de
mim e pra mim. Meu Deus! Como elas estavam molhadas, lindas,
apetitosas, querendo a minha mordida lasciva. Elas se exibiam como se
soubessem de seus efeitos, de minhas vontades que guardei à sete chaves
porque tinha medo. Quais foram os transes que me neguei?
O mais
lindo, o que vi uma única vez num restaurante, que seria o homem da
minha vida, peguei de mãos dadas com a mulher que ele agora está fazendo
feliz. Esse apenas acenou e eu sorri o meu mais lindo sorriso triste.
Todos os meus arrependimentos cantaram a minha primeira canção d'alma,
que escrevi na quarta-série naquele colégio religioso, sabendo que não
seria mais uma, sabendo que amor era grande coisa, sabendo que andaria
caminhos ainda não trilhados, sabendo que algo grandioso me aguardava.
E eu só conseguia pensar na grande ironia de todos escolherem essa música.
Olhei pra cada um deles, lembrei de cada um deles, amei novamente cada
um deles e entendi, no meio daquele lamaçal de lamúrias, que o medo
levou os meus melhores anos.
O riso do canto da boca ainda não havia se dissipado.
Peguei pra mim uma taça de vinho, tal qual Jesus, e disse: "Reparto,
então, com vocês meu pranto. Reparto com vocês minhas agruras. Reparto
com vocês minhas mortes tantas vezes morridas em cada um de vós. Toda
vez que tomarem desse cálice, lembrem-se também de mim, porque eu nunca
me esquecerei tanto de vocês, mesmo sem cálice algum".
Todos brindamos e então foram saindo um por um. Um por um...
Um por um...
Até que o derradeiro se retirou e eu fiquei, com o coração arrasado,
apertando minhas mãos até que se rasgassem mais os dedos, agarrada
unicamente à certeza de que aquela festa nunca mais aconteceria de novo.