domingo, 31 de agosto de 2025

Morri

Volto a este lugar tantos anos depois. Num desses rompantes que eu tinha antigamente. De vir aqui e me despejar espraiada, derramada, nessa página em branco que não é a do papel físico, mas que ainda me dá essa impressão, já que também aceita tudo, inclusive eu.

Estou em Vitória, pela primeira vez num congresso que eu sempre quis vir, mas que nunca vim por nunca ter achado antes que era um caminho meu. As voltas com a saudade dos meus dois grandes amores e meio chorosa por ter vindo por tempo demais, tenho pensado nessas experiencias que a Vida me trouxe quando decidi renascer, depois de tantos infortúnios. Penso nos meus medos, nas minhas inseguranças, nas minhas enormes fraquezas e até mesmo no que eu acredito que possam ser minhas fortalezas, que já me enganaram mais de uma vez. Eu lembrei que eu ainda consigo escrever, falar pra mim, falar de mim, num exercício que, a primeira vista (a bosta do teclado quebrado não me deixar crasear o que eu tenho que crasear - mas eu sei que tem que crasear!) pode parecer apenas um narcisismo barato, mas que traz a reflexão de que há algo aqui dentro que está morto que está pedindo pra renascer, reviver, ir pra fora, desmorrer.

Porque eu morri sim quando parei de escrever. Eu morri sim quando eu parei até de ler o que eu gosto. Eu morri quando meu filho nasceu daquela forma traumática e era apenas a vida dele que restava pra ser salva, vivida, resgatada. E morri quando descobri a grande merda que esparramou nos cantos da minha vida familiar. E morri tantas vezes que é difícil olhar no espelho e ainda ver que há alguém que, efetivamente, não morreu ainda. Não morreu porque ainda deseja, ainda sonha, ainda pulsa, ainda bate, ainda goza, e como goza, do que ainda está por aí. To aqui em Vitória porque preciso. Não foi lapso porra nenhuma: era necessidade de estar aqui, de estar só, de me ver mulher de novo, de me encontrar, de achar que ainda presto pra alguma coisa e de mandar pra puta que pariu toda e qualquer voz que me queira usurpar do direito e do dever categórico de existir pra além do que eu morri.